Pão de trigo e linguiça para a merenda
Sempre dá para enganar a saudade.
Não sei quanto tempo se demorava do interior do país aos subúrbios de Lisboa nos anos 70, talvez um pouco menos do que as 11 a 14 horas que costumo levar daqui. No final dos anos 80, a fazer fé nos Xutos, de Bragança a Lisboa ainda eram 9 horas de distância. Sem internet, suponho que se comunicava menos, as novidades urgentes por telefone, com minutos contados, mais longas por carta. As cartas então guardavam-se numa caixa de sapatos, as videochamadas de agora apenas na memória.
O que por cá não chega são pacotes de pão de trigo e linguiça (de qualquer modo a linguiça é proibida). E as saudades também se matam com comida. Graças à globalização, ainda vamos tendo por aqui muita coisa (com pegada de carbono capaz de pôr a Gretha à beira de um ataque de nervos, mas isso agora não interessa nada).
O único estabelecimento de restauração e bebidas que houve por estes lados, a Confeitaria Nacional, abriu em Riade em 2016 e fechou em 2017. A pastelaria era demasiado refrigerada e ficava seca, a parte da restauração tentava adaptar-se aos gostos locais. Acabou por não agradar aos locais nem aos nossos nacionais (por exemplo, o bacalhau à Braz levava batata frita às rodelas).
Já houve também uma pastelaria portuguesa em Jidá, mas fechou no fim de 2022.
Resta-nos portanto a cozinha em casa. Não se encontra maçã bravo de esmolfe, couve galega ou agrião. Mas já se encontra azeite Gallo e Oliveira da Serra, e sumos Compal e café Delta. Há géneros que se conseguem transportar na bagagem, queijo, conservas, arroz carolino (ouvi dizer que há quem traga enchidos às escondidas, não sei quem).
E bacalhau.
Talvez o indivíduo que decidiu que era boa ideia salgar um peixe do Mar do Norte, já intuísse que um dia esse seria o prato nacional, e até daria para transportar na bagagem dos expatriados em países muçulmanos. E havendo bacalhau, aqui há quase tudo o resto, batatas, grão, natas, cenouras, algumas couves…
Também se vai encontrando polvo. E sardinhas, mas essas não sabem ao mesmo.
Para quem sente saudade de um cozido, feijoada ou uma cabeça de garoupa cozida, não é fácil, só mesmo nas férias. O resto lá se vai cozinhando, sempre dá para enganar a saudade.