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Gare do Oriente, Médio

Dois arquitectos portugueses emigram para o Reino da Arábia Saudita. Um escreve (às vezes também esquiça), outro fotografa.

Gare do Oriente, Médio

Dois arquitectos portugueses emigram para o Reino da Arábia Saudita. Um escreve (às vezes também esquiça), outro fotografa.

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Este senhor chama-se Ahmed, adormeceu no lounge do aeroporto de Jidá. Regressa ao Cairo, foi o voo mais barato que encontrou a partir de Manama, mais em conta que o voo directo. Saiu às 4 da manhã do Bahrein, onde trabalha como engenheiro mecânico, numa empresa de importação, instalação e manutenção de equipamentos de ar-condicionado.

Ahmed nasceu e cresceu em Faisal, um bairro amorfo nos arredores do Cairo.

Todos os irmãos, e uma das irmãs, se licenciaram em engenharia, na Universidade do Cairo, a irmã mais nova acabou por casar quando terminou o secundário, é recepcionista num escritório de contabilidade.

Ahmed não foi o primeiro dos irmãos a emigrar, seduzido pelas oportunidades dos países do Golfo, bem acima dos salários praticados no Egipto. Casou logo que acabou o curso, com Heba, contabilista, colega da irmã. Os filhos sucederam-se, com 2 anos de intervalo, as despesas começaram a subir. À volta do Cairo brotam como cogumelos as villas de ex-colegas da faculdade, actualmente a residir em Riade, Dubai ou Doha.

Ahmed também sonha com uma villa. Sonha neste momento com a mudança do T2, a dois quarteirões daquele onde cresceu, deixar o ruído dos vizinhos, a confusão das ruas movimentadas, o fumo e o cheiro a fritos que se entranham nas roupas estendidas.

As amigas de Heba vão publicando imagens de estadias em Sharm El Sheik, Heba partilha com o marido.

Ahmed enviou vários currículos, respondeu a vários anúncios, abraçou a primeira proposta que o acolheu, engenheiro júnior em Manama, sempre fica à beira mar, mais tarde poderá trazer Heba e os miúdos. Já passou um ano, ainda divide um apartamento com dois colegas, o custo de vida em Manama é mais alto que no Cairo, não há procura para contabilistas expatriadas. Talvez em Jidá estivesse melhor.

Ahmed não está de férias, aproveitou os feriados do Eid-Al-Ahda para passar algum tempo com a família. Continua a falar com eles por videoconferência, mas a cada regresso parece ter perdido anos do crescimento dos filhos.

E sonha com Heba. Transporta o seu sorriso, a sua voz, a suavidade seu toque, mas é a memória do seu cheiro que a espaços faz desabar todo o peso da saudade. Mas Heba também quer uma villa em El-Shorouk.

A empresa de Ahmed tem escritórios em Riade, já pediu transferência, aguarda resposta, parece que na Arábia se ganha melhor. Ainda assim, há que contar com o custo da escola para os miúdos, talvez seja mais fácil para Heba conseguir um emprego como contabilista em Riade.

Ahmed desperta, o portão de embarque da Saudia já abriu, esfrega os olhos, agarra na mala de cabine, sorri, em duas horas estará nos braços de Heba, terá os filhos nos braços. Em dois anos estarão de férias numa villa em El-Shorouk.